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Como rede de fake news financiada pela Rússia tenta interferir em eleição na Europa
Publicado em 29/09/2025 07:35
NOTICIAS INTERNACIONAIS
Oana Marocico, Seamus Mirodan e Rowan Ings Role,Da BBC News

Uma rede secreta financiada pela Rússia está tentando atrapalhar as próximas eleições democráticas em um país do Leste Europeu, segundo descobriu a BBC.

Com a ajuda de uma repórter infiltrada, descobrimos que a rede prometia pagar aos participantes se eles publicassem propaganda pró-Rússia e notícias falsas que prejudicassem o partido pró-União Europeia no poder na Moldávia antes das eleições parlamentares de 28 de setembro no país.

Os participantes foram pagos para encontrar e gravar secretamente apoiadores da oposição pró-Rússia da Moldávia — e também para realizar uma pesquisa falsa. Isto foi feito em nome de uma organização inexistente, o que é ilegal. Os resultados desta pesquisa falsa, sugeriu um organizador da rede, poderiam lançar as bases para questionar o resultado das eleições.

Os resultados da pesquisa falsa, sugerindo que o partido no poder perderá, já foram publicados online.

De fato, pesquisas oficiais sugerem que o Partido da Ação e Solidariedade (PAS), fundado pela presidente Maia Sandu, está atualmente à frente do Bloco Eleitoral Patriótico (BEP), que é pró-Rússia.

Descobrimos ligações entre a rede secreta e o oligarca moldavo Ilan Shor — sancionado pelos EUA por "operações de influência maligna do Kremlin" e agora foragido em Moscou. O Reino Unido também o sancionou por corrupção.

Também encontramos ligações entre a rede e uma organização sem fins lucrativos chamada Evrazia. 

A Evrazia tem ligações com Shor e foi sancionada pelo Reino Unido, pelos EUA e pela UE por supostamente subornar cidadãos moldavos para votarem contra a adesão à UE no ano passado. O referendo sobre a adesão foi aprovado, mas por uma margem muito pequena. 

"Em 2024, o foco da campanha [de Ilan Shor] era dinheiro. Este ano, o foco é desinformação", disse o chefe da polícia da Moldávia, Viorel Cernauteanu, ao Serviço Mundial da BBC.

Pedimos a Ilan Shor e à Evrazia que se manifestassem sobre as conclusões da nossa investigação, mas eles não responderam.

A Moldávia pode ser pequena, mas, situada entre a Ucrânia e a Romênia, membro da UE, tem importância estratégica tanto para a Europa quanto para o Kremlin, afirmam especialistas.

O Serviço Mundial da BBC se infiltrou na rede — coordenada pelo aplicativo de mensagens Telegram — por meio de um link enviado a nós por um denunciante.

Isso nos deu uma visão crucial sobre como funciona uma rede de propaganda antidemocrática.

Nossa repórter infiltrada Ana e outros 34 recrutas foram convidados a participar de seminários secretos online que "preparariam os agentes". Com títulos como "Como passar da sua cozinha à liderança nacional", eles pareciam servir como um processo de seleção. Ana e os outros tiveram que passar por testes regulares sobre o que haviam aprendido.

Nossa repórter foi então contatada por uma coordenadora de rede chamada Alina Juc. O perfil de Juc nas redes sociais indica que ela é da Transnístria, uma região separatista do leste da Moldávia leal a Moscou, e seu Instagram mostra que ela fez várias viagens à Rússia nos últimos anos.

Juc disse a Ana que ela receberia 3 mil lei moldavos (cerca de R$ 950) por mês para produzir publicações no TikTok e no Facebook durante o período pré-eleitoral, e que o dinheiro seria enviado pelo Promsvyazbank (PSB) — um banco estatal russo sancionado que atua como banco oficial do Ministério da Defesa russo e é acionista de uma das empresas de Ilan Shor.

Ana e os outros recrutas foram treinados para produzir publicações nas redes sociais usando o ChatGPT. Foi-lhes dito que o conteúdo "atrai as pessoas se a imagem contiver alguma sátira... sobre a realidade", mas que se deve evitar o uso excessivo de IA para garantir que as publicações pareçam "orgânicas".

Dentro do grupo do Telegram, Ana e a BBC tiveram acesso às instruções anteriores enviadas aos participantes. Inicialmente, eles tinham sido solicitados a fazer publicações patrióticas sobre figuras históricas da Moldávia, mas, gradualmente, as exigências tornaram-se abertamente políticas.

Ana foi solicitada a publicar alegações infundadas, incluindo que o atual governo da Moldávia está planejando falsificar os resultados das eleições, que a possível adesão da Moldávia à UE depende de seus cidadãos se tornarem LGBTQ+ e que a presidente Sandu está facilitando o tráfico de crianças.

 Tela de computador com instruções para rede de desinformação da Moldávia

Legenda da foto,Um exemplo de instruções emitidas pela rede para criar desinformação — diz aos participantes para compartilharem frases sem fundamento como "O regime da [presidente] Sandu usa crianças como moeda viva" e "O SanduPAS [uma referência ao partido no poder] está envolvido no tráfico de pessoas".

Nos últimos anos, as campanhas em redes sociais se tornaram fundamentais nas eleições nacionais de praticamente todos os países. A BBC monitorou as publicações nas redes sociais que apoiavam o partido no poder na Moldávia, o PAS, mas não descobrimos nenhuma campanha de desinformação óbvia.

Durante toda a nossa operação secreta com a rede da oposição, compartilhamos apenas publicações que eram factualmente precisas e limitamos o seu número.

Queríamos descobrir quem mais fazia parte da rede, pois tínhamos evidências de que ela era composta por vários grupos semelhantes ao que havíamos infiltrado. Procuramos padrões de atividades semelhantes em outras contas que pudéssemos monitorar por meio do nosso acesso ao Telegram.

Concluímos que a rede é composta por pelo menos 90 contas do TikTok — algumas se passando por veículos de notícias — que postaram milhares de vídeos, totalizando mais de 23 milhões de visualizações e 860 mil curtidas desde janeiro. A população da Moldávia é de apenas 2,4 milhões de habitantes.

Compartilhamos nossas descobertas com o Digital Forensic Research Lab (DFRLab), com sede nos Estados Unidos, que nos informou que sua análise mostra que a rede pode ser ainda maior. A rede mais ampla acumulou mais de 55 milhões de visualizações e mais de 2,2 milhões de curtidas no TikTok desde janeiro, descobriu o DFRLab.

 A presidente da Moldávia, Maia Sandu (centro), fala à imprensa após votar nas eleições presidenciais em uma seção eleitoral em Chisinau, em 3 de novembro de 2024. Maia Sandu tem cabelos castanhos curtos e veste um elegante casaco cinza.

A presidente Maia Sandu afirma que um ataque contra ela é um ataque contra a UE

 

A rede não se limitou a publicar desinformação. Juc também ofereceu a Ana 200 lei moldavos (R$ 64) por hora em dinheiro para realizar uma sondagem não oficial, entrevistando pessoas na capital da Moldávia sobre os seus candidatos preferidos nas eleições.

Antes de realizar essa tarefa, os participantes receberam treinamento sobre como influenciar sutilmente os entrevistados.

Também lhes foi pedido que gravassem secretamente os entrevistados que diziam apoiar a oposição pró-Rússia.

Juc revelou que isso era para "evitar que a votação fosse fraudada", sugerindo que os resultados da pesquisa e as gravações secretas seriam usados, no caso de uma vitória do PAS, como supostas evidências de que ele havia vencido de forma injusta.

Nossas evidências também sugerem que a rede à qual nossa repórter se juntou está sendo financiada pela Rússia. Ana ouviu — e filmou — Alina Juc ao telefone pedindo dinheiro a Moscou.

"Ouça, você pode trazer dinheiro de Moscou... Só preciso pagar os salários do meu pessoal", filmamos ela dizendo.

Não ficou claro quem lhe enviaria o dinheiro, mas encontramos ligações entre a rede e Ilan Shor por meio da ONG Evrazia. 

O candidato parlamentar da Moldávia, Ilan Shor, empresário, líder do partido que leva o seu nome e presidente da câmara da cidade de Orhei, encontra-se com apoiantes durante um evento de campanha na cidade de Comrat, em 15 de fevereiro de 2019. Ele veste um fato escuro e gravata vermelha e aperta a mão a alguém durante a campanha eleitoral. Várias senhoras idosas com lenços na cabeça estão ao fundo.

A rede tem sido associada ao oligarca moldavo Ilan Shor, visto em campanha no país em 2019 e agora foragido em Moscou.

Ilan Shor e Evrazia não responderam às conclusões da nossa investigação.

A BBC encontrou fotos da supervisora de Ana, Alina Juc, no site da Evrazia — e um dos grupos do Telegram aos quais Ana foi adicionada chamava-se "Líderes da Evrazia".

O Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido afirma que a Evrazia opera "na Moldávia em nome do oligarca corrupto e fugitivo Ilan Shor... com o objetivo de desestabilizar a democracia moldava".

Pedimos a Alina Juc que comentasse nossas conclusões, mas ela não respondeu.

O TikTok afirmou ter implementado medidas adicionais de segurança antes das eleições e continuou a "combater agressivamente comportamentos enganosos". A Meta, proprietária do Facebook, não respondeu às nossas conclusões.

A embaixada russa no Reino Unido negou envolvimento em notícias falsas e interferência eleitoral e disse que é a UE que interfere nas eleições da Moldávia.

Reportagem adicional: Malvina Cojocari, Andreea Jitaru, Angela Stanciu

 Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cvgq1yl32r1o

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